A Sextorsão e a Impossibilidade de Configuração do Crime de Estupro Virtual

Crime de Estupro Virtual

Passou-se a aventar a possibilidade da prática do estupro virtual, com o fito de punir o indivíduo que, através da rede mundial de computadores, constrange alguém a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.

Cunhou-se, assim a expressão estupro virtual e, ainda, passou-se a utilizar a expressão sextorsão, originalmente utilizado pelo FBI em casos de extorsão sexual pela internet.

Basicamente, aqueles que defendem a possibilidade de adequação típica desses casos ao crime de estupro afirmam que, a partir do momento em que um indivíduo, através de ameaças, constrange outrem, em ambiente virtual, a se exibir de forma pornográfica, muitas vezes se masturbando ou praticando outros atos sexuais, pratica fato análogo ao descrito no artigo 213 do Código Penal que prevê, também, que é crime constranger alguém, mediante grave ameaça, a praticar ou permitir que com ele se pratique ato libidinoso.

Ainda que se possa elucubrar sobre a adequação típica de referida conduta ao crime de estupro, pois, pode-se supor que em tais hipóteses existiria o constrangimento – ainda que em ambiente virtual – à prática de ato libidinoso, não é menos certo que existem barreiras insuperáveis a tal tipificação.

A primeira barreira reside em outro tipo penal de nosso ordenamento jurídico, qual seja, o artigo 241-D do ECA.

Cite-se:

Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)

Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)

Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem: (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)

I – facilita ou induz o acesso à criança de material contendo cena de sexo explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso; (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)

II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita. (Incluído pela Lei nº 11.829, de 2008)

Basicamente, referido artigo, mais especificamente o inciso II, do parágrafo único, diz que é crime o fato de um adulto constranger ou induzir uma criança a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.

Certamente que essa conduta pode ser praticada pela rede mundial de computadores.

Assim, chega-se ao seguinte paradoxo: se um hacker constrange uma mulher adulta, pela internet, a se exibir pornograficamente pratica estupro virtual. Todavia, se o mesmo hacker constranger uma criança, praticará o crime descrito no artigo 241-D do ECA, com apenamento, obviamente, muito menor.

Referido conflito é absurdo e, obviamente, afasta qualquer análise mais severa sobre a sextorsão, posto que afronta os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade.

Há, ainda, que se ponderar que o crime de estupro dispõe ser crime constranger alguém a praticar ou permitir que com ele se pratique o ato libidinoso, ou seja, pressupõe que seja indispensável a participação material (física) do sujeito ativo no ato libidinoso.

Assim é que fazer com que a vítima – pela internet – se exiba nua, ou de forma sexualmente explícita, não configura o crime de estupro, por absoluta inadequação típica.

Todavia, certamente que não se pode concluir que referida conduta é atípica, afinal de contas, poderia haver pela internet o constrangimento criminoso para que a vítima se exibisse sexualmente e, nesse caso, a solução certamente encontra-se no crime de constrangimento ilegal descrito no artigo 146 do Código Penal que prevê:

Art. 146 – Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, ou depois de lhe haver reduzido, por qualquer outro meio, a capacidade de resistência, a não fazer o que a lei permite, ou a fazer o que ela não manda: Pena – detenção, de três meses a um ano, ou multa.

A análise do tipo penal em questão deixa claro que a conduta daquele que constrange alguém a se exibir pornograficamente pela internet se amolda, com muito mais precisão, ao crime de constrangimento ilegal do que ao de estupro.

Portanto, os tempos modernos e as novas práticas não devem fazer com que amoldemos os crimes aos fatos, mas sim, e como deve ser, os fatos aos crimes e, neste caso, o tipo ao qual melhor se adequam os fatos tratados é o de constrangimento ilegal.

Tadeu Teixeira Theodoro

Advogado do escritório Cláudia Seixas Sociedade de Advogados

 

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